AI Workslop e o Paradoxo da Produtividade

Entre a promessa de produtividade e o risco do workslop, a IA só gera valor quando usada com intenção, governança e criticidade.

A ascensão da inteligência artificial nas empresas vem sendo apresentada como uma revolução produtiva. Ferramentas generativas prometem eficiência, agilidade e inovação. Mas, estamos testemunhando também o surgimento de um novo inimigo da produtividade: o workslop — conteúdos gerados por IA que parecem bons, mas carecem de substância real e acabam reduzindo a eficiência das equipes e impactando na qualidade dos entregáveis.

Quando o excesso de IA atrapalha

Recentemente a Harvard Business Review publicou um artigo que mostra que cerca de 40% dos profissionais afirmaram ter recebido workslop — e-mails, relatórios, apresentações ou textos produzidos por inteligência artificial — no último mês. Cada um desses materiais exigiu, em média, duas horas de retrabalho para ser interpretado, corrigido ou refeito. O custo estimado? US$ 186 por empregado por mês em perda de produtividade. 

Além do tempo perdido, há um efeito mais sutil: quem produz workslop é percebido como menos criativo e menos confiável pelos colegas. Em outras palavras, a má utilização da IA não apenas consome recursos, mas corrói a credibilidade dos profissionais que deveriam se beneficiar dela.

Cuidado! A IA pode estar destruindo sua reputação!

Essa prática ocorre principalmente entre colegas (40%), mas também é enviado aos gerentes por subordinados diretos (18%) e em 16% das vezes, o workslop flui para baixo na hierarquia, dos gerentes para suas equipes, ou até mesmo de níveis mais altos impactando negativamente na imagem das lideranças e passando mensagens confusas sobre produtividade versus qualidade.

Esse fenômeno tem sido identificado também em estudos sobre motivação e uso de inteligência artificial. Pesquisas recentes mostram que o uso acrítico de ferramentas automáticas leva a um aumento do “tédio cognitivo” e da queda de engajamento entre profissionais que dependem da IA para tarefas rotineiras.

Não à toa uma das habilidades mais valorizadas no mercado em 2025, segundo o Fórum Mundial Econômico é a criatividade. Me parece difícil manter a mente criativa em um mundo de workslop, não é mesmo?

World Economic Forum: The Future of Jobs Report 2025

O outro lado da moeda: o otimismo produtivo

Enquanto alguns estudos revelam o lado obscuro da automação, outros confirmam os ganhos quando a IA é bem aplicada. Segundo levantamento global da Bain & Company (2024), 67% das empresas brasileiras já consideravam a IA uma prioridade estratégica. Entre as organizações que implementaram a tecnologia, observou-se um aumento médio de 14% na produtividade e um crescimento de 9% nos resultados financeiros.

Outro dado reforça o otimismo: 79% das empresas que utilizam inteligência artificial generativa afirmam que o principal objetivo é justamente ampliar a produtividade (TI Inside, 2025). Mas a mesma pesquisa revela um contraponto: 47% dos colaboradores que usam IA não sabem como atingir as metas produtivas esperadas, e 40% dizem que as demandas estão além do razoável (Forbes Brasil, 2025).

Sobra tecnologia e falta gestão e liderança…

Ou seja, a promessa de produtividade nem sempre se concretiza. E o workslop — a produção de conteúdo sem filtro crítico — pode estar entre as principais causas dessa frustração.

Por que o workslop acontece

O problema não está na IA em si, mas na forma como ela é integrada ao trabalho. Entre as principais causas identificadas:

• Delegação excessiva: líderes e equipes tratam a inteligência artificial como substituta do julgamento humano.

• Falta de governança: não há políticas claras sobre quando e como usar inteligência artificial.

• Capacitação insuficiente: profissionais não sabem validar ou editar saídas automáticas.

• Pressão por produtividade: a cultura de “fazer mais com IA” leva à superficialidade.

• Carga cognitiva invertida: quem recebe o conteúdo acaba gastando mais tempo ajustando do que criando do zero.

Esses fatores explicam por que muitos projetos de inteligência artificial corporativos não entregam retorno mensurável, mesmo em contextos de alta expectativa.

A análise das causas do fenômeno workslop e a discussão sobre boas práticas para líderes merecem um próximo artigo. 😉

IA com consciência gera valor

A inteligência artificial é, sem dúvida, uma das maiores forças de transformação empresarial do século. Mas, como toda tecnologia, exige disciplina, crítica e propósito.

Se usada de forma acrítica, a inteligência artificial pode se tornar um “antivírus da produtividade”: algo que promete acelerar o trabalho, mas acaba contaminando os processos com retrabalho e superficialidade.

Quando líderes tratam a inteligência artificial como ferramenta de aceleração consciente, o resultado é o oposto: mais tempo para o pensamento estratégico, decisões embasadas e times realmente produtivos.

Em última instância, o desafio que enfrentamos não é tecnológico, mas humano. A inteligência artificial pode multiplicar a capacidade de produção, mas apenas o pensamento crítico e o discernimento humano podem garantir relevância, sentido e valor. Como já apontava Peter Drucker, “eficiência é fazer as coisas da maneira certa; eficácia é fazer as coisas certas” — uma lição que se torna ainda mais urgente na era da automação com inteligência artificial.

A verdadeira produtividade não está em produzir mais, e sim em produzir melhor. Cabe aos líderes resgatarem esse princípio e colocá-lo no centro das decisões sobre o uso de inteligência artificial. Porque, no fim das contas, não é a máquina que define o progresso — é o propósito humano por trás dela.

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Andrea Paiva

Diretora de Pós-Graduação Digital no Grupo Alun (Alura, FIAP e PM3), onde lidera o desenvolvimento de soluções educacionais que integram teoria e prática, com foco em impacto real na formação profissional. Graduada em Tecnologia pela FATEC SP, Doutora em Administração pela FEA-USP, especialista em Empreendedorismo pela Babson College e em Gestão de Dados pelo MIT. Com mais de 20 anos de experiência no ensino superior e atuação em projetos estratégicos em EY, PwC e Accenture. É voluntária no MCIO, como mentora de executivas em transição de carreira, host do The EdUP Experience Podcast, debatendo inovação e futuro da educação.